quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Placa MÃE



Empreender ou Inovar?!

"Empreender não é, necessariamente, inovar. Em nossa sociedade, nos dias atuais, empreender é entender e ASSUMIR ser necessário avaliar se há capacidade OU NÃO de se inovar. A partir daí, empreender é reestruturar seu setor e sua organização, para enfrentar, com a menor perda de danos possível, os momentos econômicos turbulentos que atravessamos."

Jefferson  Santos



Resiliência



Arrogância



O furo e o caráter!!


O FURO NO BARCO!


Um homem foi chamado para pintar um barco que se encontrava na praia. Trouxe tinta e pincel e começou a pintá-lo de um vermelho brilhante, conforme combinado.

Enquanto pintava, percebeu que a tinta se infiltrava por um furo e deduziu que havia um vazamento. Decidiu consertá-lo. Quando terminou a pintura, recebeu o pagamento pelo serviço e foi embora.

No dia seguinte, o dono do barco foi procurar o pintor e o presenteou com um vultoso cheque. O pintor ficou admirado:

“Você já me pagou pela pintura do barco” – disse.
“Mas isto não é pelo serviço de pintura. É por ter consertado o furo no barco.”
“Foi algo tão pequeno que nem quis cobrar. Certamente, você não está pagando esta grande soma por uma coisa tão insignificante.”

“Meu caro amigo, você não compreendeu. Deixe-me contar o que aconteceu. Quando lhe pedi para pintar o barco, esqueci de contar sobre o furo. Depois que o barco ficou bonito e seco, meus filhos foram pescar. Eu não estava em casa neste momento. Quando voltei e notei que haviam saído com o barco, fiquei desesperado ao me lembrar do furo. Imagine meu alívio e alegria quando os vi retornar sãos e salvos. Então, examinei o barco e constatei que você o havia consertado! Agora compreende o que fez? Salvou a vida de meus filhos! Não tenho o bastante para pagar pela “pequena” coisa boa que você fez…”

O caráter da ação, o caráter do reconhecimento!!
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Vida conectada. Desconectou...



quarta-feira, 12 de agosto de 2015

O velho relojoeiro




Por Prof Jefferson W Santos MsC

Breves considerações sobre o conhecimento agregado.

Em um subúrbio londrino existia um relojoeiro, já com idade avançada. Trabalhar, para ele, era a razão de sua vida. Ensinar seu ofício era um prazer constante. Poucos, entretanto, tinham a paciência com a qual ele se dedicava aos relógios de todo o tipo. Seus aprendizes não tinham a mesma abnegação e logo desistiam. Ele já havia consertado muitos relógios ao longo de sua vida.

Certa feita, um rico senhor apareceu em sua modesta lojinha. Com desdém, quase sem disfarçar a repugnância por aquele estabelecimento tão diferente das lojas de classe alta que ele freqüentava, abordou o humilde artesão. "Meu caro senhor! Aqui tenho um relógio muito raro. Ele está com um defeito que, até agora, nenhum especialista, nesta ilha ou fora dela, conseguiu descobrir." "O que podes fazer?!" "Quanto tempo levarás para consertá-lo?!"

Sem disfarçar sua descrença naquela, para ele, simplória figura, muito distante de sua casta, o empinado senhor pousou suavemente o relógio na mesa da oficina. Já em retirada exclamou: "Outros especialistas levaram muito tempo com ele e nada consertaram! Espero que não tome muitos dias para descobrir! Cuidado!! É uma peça rara!"

Sem nada dizer o velho calmamente pegou sua lente monocular, buscou em uma caixa de ferramentas uma haste muito fina e longa. Abriu a raridade e detidamente analisou seu interior. Com firmeza, adentrou a ferramenta por trás das engrenagens antigas e robustas. Alcançou uma haste muito delicada, quase invisível. Recolocou-a no lugar e devolveu o relógio para o impávido aristocrata. "Aí o tens funcionando perfeitamente!"

Ainda sem acreditar no que via, o elegante senhor perdeu a rigidez e quase curvando-se em gratidão exclamou: "Como pode?! Tão rápido!!! Quanto custa?" Sem titubear o velho respondeu: "São duas mil libras, caro senhor!" Sem acreditar no que ouvia o petulante cliente exclamou: "Que ultraje!! Tal preço por um trabalho que não durou um minuto!!!"

Sem querelas, o velho tomou delicadamente o relógio do nobre, introduziu a pinça e retirou a haste de seu recanto. Devolveu a relíquia para o espantado homem: "Toma! Vai procurar quem te faça mais barato!"

Essa estória nos ilustra a segurança e a competência geradas pelo conhecimento agregado com trabalho diligente. O valor cobrado recompensava anos de experiência e dedicação, que permitiram ao mestre corrigir tão rapidamente o defeito. Ao colocar o relógio na condição original, ele impôs o devido respeito que sua excelência reclamava... Pois sabia que poucos, ou mesmo ninguém, poderia resolver o problema sem danificar a raridade.

Como toda fábula, essa traduz-nos verdades simples, colhidas de experiências vivenciadas.

Quantos relógios você já consertou em sua carreira?!?! Quais deles eram raridades?!?!

Pense sempre nessa fábula! Procure desenvolver e aplicar a excelência em tudo o que você fizer e a recompensa lhe virá de forma natural e consequente.

Boa sorte!
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Tudo que seu Mestre fizer...fazeremos todos!!

Por Jefferson Santos
Data de Publicação: 03 de Março de 2015

A vida é uma escola. As experiências que adquirimos nos momentos de nosso dia a dia fortalecem os conceitos sobre o que lemos e, eventualmente, discutimos a partir da leitura e reflexão permitidos por bons livros.

Tive sorte de, logo cedo, me atinar para isto. E o hábito de observar e, depois, acudir-me de algum livro muito me ajudou na vida e na carreira.

Das experiências mais singelas, porém marcantes, veio do dito atribuído a Confúcio "Se palavras convencem, o exemplo arrasta"!! Ou algo semelhante que agora não faz diferença.

Era tenente novo, cheio de gás e vontade de interagir com o mundo, quiçá mudá-lo. O cenário era o meio da selva amazônica, cujo local, para minha decepção, não tinha nem índias "iracêmicas" com lábios carnudos e olhos cor de mel, tampouco aves coloridas e frutas despencando de frondosas árvores. Os habitantes, em sua maioria, eram "esmirradinhos". À exceção de alguns filhos de imigrantes da região sul, destoando das peles morenas, mas ainda assim, com as suas curtidas sob o escaldante sol que ao meio dia era muito mais quente que as praias cariocas no verão.

Esquecidos, ou sem dinheiro para voltar ao sul, lá ficaram, nas cercanias de uma irrisória cidade, Pedra Branca, no interior do Amapá AP, e ao sul da Serra do Navio, já totalmente esgotada pela subtração de minério pelos americanos... sempre tão bonzinhos!

Lá cheguei, em uma área descampada, onde havia um resto de acampamento feito por uma grande construtora que abandonara o sítio do que seria o início do último trecho brasileiro da Transamazônica.

Como cheguei na parte da tarde, após receber o "serviço" do colega anterior e estava próximo ao pôr do sol, tampouco nenhuma decolagem seria possível, passei a matar o tempo me aproximando dos nativos de um vilarejo próximo. Claro que a maioria jogava bola, mas um pequeno grupo jogava uma brincadeira que eu adorava em minha infância na Baixada Fluminense: "Seguir o Mestre".

O interessante é que ali as crianças mantiveram um hábito que eu desconhecia. A criança que seria a "carniça" para levar tapas no bumbum usava um tipo de manta. Ele imitava o "Frade distraído" que as crianças surpreendiam.

As ordens jesuítas e franciscanas tiveram uma presença muito intensa na Amazônia desde o reinado de Manoel III. Elas não só catequizavam como ensinavam várias atividades domésticas. Os frades eram presenças essenciais nas pequenas comunidades. Por intermédio deles a Educação se fazia presente, não só no ensino da Bíblia como também do Português, História, Geografia e outras matérias reduzidas para a construção da vida em grupo, da cidadania dos esquecidos das ínvias regiões de um país-colônia.

Tudo o que o "Seu Frade, o Mestre" fazia, era copiado. Sua preocupação com o exemplo de cidadania e religiosidade manteve, ainda que de forma incipiente, um quê de dignidade àqueles remotos e esquecidos cidadãos.

As lembranças e a imagem da brincadeira do Mestre ficaram na mente naquela noite. Ao acordar, como era o segundo mais antigo do acampamento, tomei a inciativa de interagir mais de perto com aquela comunidade.

Estávamos com restrições de diárias e o resultado era uma grave redução de auxiliares e o trabalho não era pouco. Assim, optei "resolver a parade" com os "assets" disponíveis.

Fui confabular com minha "cadeia de valor", meus precedentes: o "Chief" da Manutenção, um Suboficial austero, gaúcho do interior, de descendência alemã e formação luterana. Pelos predicados já dá para se vislumbrar o pouco espaço para "criatividade" e "laissez faire". No meio da selva o que menos precisamos é de inventores e inovadores. Se as cartilhas, normas e "cartões de inspeção" não forem seguidos à risca estávamos fritos, e o lídimo guardião de nossa segurança e certeza do retorno para casa, "andando" (WNC - Walking, not in coffin!), era o Subão, nosso "Master Chief" - nome como continha nos manuais doutrinários do Bell 205, advindos do combate no Vietnam.- Tanto melhor. O rigor e o aprendizado seriam bem consistentes.

Claro está que convencê-lo de minha "inovação" não foi fácil. Apesar de minha ascendência hierárquica, ele sabia se impor. Imagine na estrutura de seu modelo mental e "zona de conforto": Auxiliares de manutenção não só pré e adolescentes como, também, índios e imigrantes que, sequer, conseguiam falar uma frase inteira sem usarmos da "tecla SAP" do agente da Funai lá destacado.

Confesso que quase desisti da ideia quando ele, nervoso e, justificadamente, apreensivo com a ideias do jovem e idealista tenente, começou a replicar em seu mais genuíno dialeto gauchês germânico. Pronto, arrumei uma torre de Babel no meio da Amazônia. Já me via o perfeito Indiana Jones.

Meio ressabiado vendo uma grande sacada voar selva acima, tentei argumentar e refazer meu "projeto", ao embalo de doses de Velho Barreiro. E olha que eu não bebia muito, tampouco cachaça da braba, mas ali, no meio do "nowhere", só mesmo a velha pinga para nos tornar imunes às dolorosas picadas dos mutuns.

Fui salvo pela famosa figura do "Cabo Véio". - Chefe, tá comigo! E realmente, tava.

À noite, durante as rodadas de "sueca" com baralhos já amassados e repletos de marcas "maceteadas" visíveis até pelos anciãos, o Cabo Véio convenceu o Subão. Maravilha, dois dias depois a garotada matuta fazia fila e formatura junto a todos nós para o hasteamento da Bandeira Nacional, no nascer do sol.

Que experiência fenomenal. Pena que não houve qualquer televisão ou repórter. Tampouco a figura dos Assistentes Sociais ou juizados de menores. Além de pouco comuns na época, impossível de estar no meio da selva. Aquilo sim foi exemplo de inclusão social, modéstia bem a parte.

Os brifins foram dados a comando do Cabo Véio tendo como auxiliares dois soldados novos. Por sorte ambos tinham pele morena curtida do sol o que facilitou a aproximação com os jovens aldeões. Assim, as orientações foram passadas, as supervisões eram constantes nos primeiros dias e depois a confiança prevaleceu sob a luz da responsabilidade de cada jovem.

Na ocasião também notei algo de pitoresco: Os imigrantes do sul eram mais sistemáticos que os nativos do norte, mas estes eram mais resistentes às intempéries, pois chovia a cântaros após um dia de calor infernal e não houve qualquer baixa entre os mestiços. Já os do sul...Cada um com sua idiossincrasia, com sua assinatura impressa em seu dna social. Sempre aprendizados.

Nosso acampamento seguiu no melhor modelo de preparação de jovens aprendizes. Eles aprenderam a sistematizar suas tarefas, a priorizar, a reconhecer a dependência do trabalho deles com relação ao anterior e a necessidade de correção, precisão e tempo oportuno para não prejudicar o colega auxiliar no setor próximo. Tudo a céu aberto. Uma oficina no meio da selva tendo o céu por abrigo e testemunha. Tirava peça, registrava. Colocava peça, registrava. Tudo na sequência, tudo limpo e arrumado.

Para minha surpresa, os garotos passaram a admirar e tentar falar igual ao "Subão". Este, por sua vez, estava já de pé antes de todos e só se retirava após todos terminarem seus setores após sua rigorosa supervisão. Para minha agradável surpresa, nenhum garoto teve que refazer qualquer atividade. Aliás, todos no acampamento nos surpreendemos com a dedicação e empenho dos jovens aprendizes.

A mesa improvisada de tonéis de combustível vazios com compensados curtidos e manchados servindo de tampão tinha ordem e limpeza. No meio da selva o Subão deixando sua assinatura. A assinatura da educação que recebera era avidamente copiada por matutos de pele curtida. Foi muito bom presenciar tal maravilhosa experiência. Lembrei das palavras de Confúcio. Quem diria. No meio da selva um show de organização e métodos. Talvez de fazer inveja, claro que guardada as devidas proporções, ao belo e encerado piso do hangar da Helibrás em Itajubá MG.

Se teve algo gratificante logo no início de minha carreira foi presenciar crianças sem qualquer acesso a educação de qualidade, imitando um austero e exemplar militar sob a batuta de um atento e líder servidor "Cabo Véio".

Na última tarde de minha missão dei-me ao luxo de juntar-me, no fim da tarde, a um grupo dos mesmos auxiliares. Eles estavam brincando de "Seu Mestre".

Infelizmente não mais voltei para Pedra Branca AP. Contudo fiquei acompanhando o desenrolar do "projeto". O sucesso da Escolinha do Prof Raimundo na televisão fazia-me lembrar dos jovens aprendizes. Eu havia inovado, sem querer, um projeto de "inclusão social" sem haver, sequer, naquela época, qualquer menção a tal neologismo. A ideia da "Escolinha do Subão" ia bem, de vento em popa, mesmo ele sendo substituído por outros. Contudo sem o seu "tom e toque". Recordava-me ajudando-os na limpeza e manutenção das toscas, mas funcionais, bancadas eficientes e de fazer inveja às similares das escolas técnicas Brasil a fora.

Com o advento do governo Sarney as ONG invadiram a Amazônia a pretexto de "cuidar" dos índios e o projeto RADAM e, no embalo a "Escolinha do Subão", foram descontinuados. Soube da consternação geral que tomou conta daquela pequena cidade.

A tristeza abateu-me ao saber. Entretanto ficou-me a sensação de dever de cidadania cumprido e, agradavelmente, na memória a cantiga que embalava a brincadeira que me fez ter a ideia:

"Bênça que benti é o Fradi... Fradi!! 
Na boca do povo... Povo!! 
Tudo o que o seu Mestre fizer... 
fazeremos todos!!"
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Bússola do GESTOR


Maslow 2015


Quando a pequena Alice arrebatou me coração em Dothan


Por Jefferson Santos
Data de Publicação: 10 de Abril de 2015

Vou lhes contar uma história de amor. Uma paixão que começou quando ainda era solteiro, portanto, segura e sem traumas.

Antes, porém, é necessário se contar como o encontro aconteceu, ainda aqui no Brasil. O início não é alegre tampouco, muito pelo contrário, é trágico.

Uma bela, quente e enluarada noite em Natal RN, estava de missão de Alerta SAR (Busca e Salvamento) para a atividade aérea na Base de Natal. Saí da sala de pilotos para receber a tripulação de outro helicóptero, um Bell 205, antigo, adquirido do patrimônio militar americano após a desmobilização de tropas da Guerra do Vietnam.

A tripulação cansada de um dia exaustivo, cumpria uma missão de instrução, noturna, em vôo de instrumentos para a formação do mais jovem dos pilotos a bordo.

Um papo alegre e descontraído teve lugar enquanto a aeronave era abastecida para, após, retornar ao Recife PE. Concluída esta fase nos despedimos e, pelo avançado da hora, prosseguimos para nosso quarto ao lado da sala de pilotos, na boca da pista de pouso. O motivo era o acionamento noturno intempestivo. Afinal, nossa missão era de Busca e Salvemento, e o sinistro não dorme.

Esgotado logo conciliei em sono sendo acordado na madrugada para decolarmos em busca de nossos amigos que haviam sumido na rota. Três horas depois, próximo ao raiar do dia, estávamos pousados ao lado dos destroços e, no amanhecer, iniciamos os procedimentos. Eu ajudei o médico SAR a separar corpos sem cabeça, para serem ensacados e, no necrotério, os corpos serem totalmente separados, uma vez que dois deles morreram, carbonizados, abraçados: Os dois mecânicos sentados no espaço destinado aos passageiros. Os pilotos não tiveram tal oportunidade por serem separados por um largo painel central e os bancos, à prova de balas, requisito da guerra, mantido por nós.

Apesar de estar de macacão e luvas, o cheiro de meus amigos carbonizados ficou em minha pele por algum tempo, da mesma forma, a marca.

Dias depois fui um dos encarregados de iniciar a investigação daquele acidente, inédito na Força Aérea Brasileira posto ser uma separação do rotor principal do corpo do helicóptero. Durante o resgate o rotor foi encontrado em uma fazenda, semi-intacto, a mais de quatro quilômetros de distância do que sobrou do FAB 8540.

Como um dos investigadores, aprofundei-me na pesquisa e li os manuais, em inglês, da Bell Hellicopter e do USArmy, na íntegra. Tomou-me quase dois meses ininterruptos. Nada de eventos com separação de rotores.

Por sorte, o Exército Americano ofereceu algumas vagas para um curso de investigação de acidentes aeronáuticos em helicópteros (Sim, eles podiam se dar a este luxo.) na Escola de Formação deles, no Fort Rucker, Dothan, Alabama USA. Era a singela e interiorana "Dothan de Alice".

Para se encontrar com minha paixão que nem imaginava vir a conhecer, tive que disputar uma vaga com outros oito oficiais, sendo só eu um "liutenant full" ou para os íntimos, um mero primeiro tenente. Dentre os oito havia dois tenentes-coronéis, um deles secretário particular do Exmo Sr Presidente da República. Imagina-se como entrei na sala de prova ao me deparar com meus competidores.

Bem, ali, no desabrochar da carreira tive a primeira lição de democracia e meritocracia. Apesar da mídia, de uma forma geral, incutir na cabeça da sociedade brasileira horrores sobre a vida em caserna, meus trinta e cinco anos de serviço ativo ensinaram-me tudo o que sei de respeito ao próximo, trabalho em equipe e, sobretudo, meritocracia.

Pois bem, o teste dividiu-se em duas etapas, uma prova no velho e lendário Campo dos Afonsos e a segunda fase, prova escrita e entrevista, no Consulado dos EUA no centro do Rio, ambos em RJ. Ao final, eu, o first lieutenant (insisto porque o aplicador da segunda prova, o Major Bell, ficou incrédulo, enfim...) logrei a maior média das duas etapas.

Voltei para casa preocupado e ressabiado, achando que apesar de ter feito minha parte e ter saído bem na foto, a vaga deveria (e a lógica indicava) ser do secretário do Presidente. Ledo engano, ledo engano.

No primeiro dia útil após o fim de semana, meu comandante me chama em sua pequenina sala e me felicita. Aproveitou para contar o que houve em Brasília, sede de nosso Comando-Geral Operacional. Nosso Comandante-Geral, em reunião, tratando da vaga do curso perguntou:

— Qual é o critério?!?

— A maior média?!

— Quem tirou a maior média?!?!

— O tenente?!?!

— Vai o tenente!! Câmbio!!

— Próximo assunto na pauta!!

E lá fui eu, feliz e lampeiro, para o interior dos States. Para a pequena, porém decente, Dothan, cidade que nunca tinha ouvido falar, tampouco tinha lido nos meus trocentos livrinhos de Faroeste (lá eu descobri que era "Far West") que lia, com avidez, um a cada dia, na minha época de estudante no Pedro II, do Engenho Novo RJ.

A segunda e rica lição que tive foi lá, no quartel. Um centro de instrução de aviação, mundial, em helicópteros. Dali os pilotos saíam, de fato, para o combate. A segunda lição ocorreu durante um dia de inverno inesperado, onde tiritávamos de frio do lado de fora do velho prédio, um coronel full americano, três tenentes-coronéis, dois majores e um bocado de oficiais da reserva ("warrant officer", mas no serviço ativo).

A lição foi constatar que enquanto um velho e barrigudo sargento, chamado de Mr Summers, não concluía a vistoria do prédio, ninguém, absolutamente, ninguém entrava. Somente após ele pendurar na porta, do lado de fora, um formulário de inspeção, repleto de itens com "checks" e sua assinatura com um carimbo em verde dizendo "Cleared" é que entrávamos. Todos sem exceção, de coronéis a tenentes aguardávamos, no frio, a liberação do prédio. Aquilo sim era disciplina intelectual, seguir regras, ser metódico e sistemático. Guardei aquele exemplo e minha bela Alice, na memória e no coração por muito tempo.

Bem, os dias se passaram com aulas detalhadamente exaustivas para todos, afinal, acidente aéreo era investigado às raias das minúcias. E isso o americano sabe fazer muito bem.

Descobríamos, por análises de "cases", vários erros do Fator Humano. Todos tinham origem em, um dado momento que precedia ao acidente, a tripulação ou alguém não ter seguido a regra, o "checklist", o previsto, o "compliance". As instruções eram claras, cristalinas: "Must comply with": Deve se proceder desta forma. Manuais e regras eram levados muito a sério. O "By the book" era quase um mantra, uma religião.

Confesso que todos aqueles casos pululavam minha mente. Eu ainda com os resquícios da surpresa de ter sido priorizado em detrimento de oficiais muito mais antigos. Ainda com o temor de chegar ao quarto do hotel e achar uma correspondência determinando minha volta por decisão superior. E ainda tentando entender o inglês absolutamente caipira e "peculiarizado" de meus simpáticos e amáveis anfitriões.

Eu estava desesperado em meio a todo aquele tumulto, encontrar um referencial que me evidenciasse uma linha básica de raciocínio, algo que me fizesse prosseguir no curso além de decorar fórmulas de física, itens de leis e regulamentos americanos, absolutamente fora de minha vida e idiossincrasia latina usual. Seguir "by the book" no Brasil, mesmo em quartel, só se fôramos Atlantis e Lemurianos...nem pensar.

Até que minhas preces foram ouvidas. Exatamente em um domingo à tarde, quando fui assistir a um culto em uma igreja americana. Era apostólica romana, mas o padre fez um discurso maravilhoso sobre responsabilidade cristã e ética social.

Ao fim, fui visitar os stands de vendas, comuns aos domingos onde famílias inteiras iam às igrejas para, também, se socializar.

O porão da igreja abrigava uma antiga biblioteca pública, então destinada a vendas dos livros como sebo. Lá, procurando um romance leve para ler, algo absolutamente fora de acidentes aeronáuticos e leis que me pudesse enlevar um pouco, pois recusava-me a ficar preso na televisão em minhas horas vagas.

Em um banquinho se equilibrando encontrei Alice. Seu cheiro não era bom, mas não resisti à tentação de tê-la em minhas mãos, absolutamente maravilhado. Passei a mão nela, ainda hipnotizado. Tirei-lhe o pouco de poeira em suas vestes e comecei a lhe explorar. Fiquei fascinado com as figuras, desenhadas à lápis. Ali encontrei a figura com o breve texto abaixo que nunca mais me esqueci. Sua voz tudo tinha a ver com o que vinha, até então, vivenciando. Era a resposta para minhas dúvidas existenciais naquela pitoresca cidade, no interior de um estado que para mim era nome de capa de bolsilivro de bangue-bangue: Alabama.

Ainda extasiado, mas cabreiro por ser visto e constatado naquele canto semi-escuro de um amontoado de livros e bancos espalhados aleatoriamente, em um porão frio de uma igreja. Acho que nem Hitcock poderia imaginar cena tão pouco usual.

Ainda ressabiado, aproximei Alice de meu rosto para sentir aquele agradável aroma de sua pele, sua capa, cheirando a um mofo gostoso e agradável. Não obstante ao preço, irrisórios 99 cents, já havia decidido levar minha jóia rara.

O diálogo e cena que arrebataram meu coração e que, por muitos anos depois, me orientou para o resto da carreira militar, como piloto civil ou líder de projetos organizacionais, vinha de uma pequenina, linda e adorável menina, com a mãozinha na testa , diante de cestos e utensílios jogados ao léu, perguntando ao Mestre Chapeleiro:

— Mestre, por onde devo começar?

Ao que o Mestre, com ar circunspecto e com a mão no queixo, lhe responde:

— Comece do começo, vá até o fim, então pare!!
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